segunda-feira, 10 de setembro de 2012



O Embarque e a Viagem ao Brasil


Conforme consta do Stato di Famiglia (registro de família) originaria da Parrocchia Nativitá di Maria, da Comune de Borgo Valsugana, a família de Antonio Voltolini emigrou dia 26\12\1875 ao Brasil. Fazia parte da comitiva, Antonio Voltolini com 59 anos e sua esposa Margherita Marchi com 57 anos e seus filhos: Maddalena com 32 anos e grávida do terceiro filho, acompanhada de seu  esposo Michele Petris com 37 anos e os filhos Luiz com 5 anos e José com 2 anos; Patrizio com 29 anos, sua esposa Catherine Paolatti com 26 anos, grávida e a filha Maria com 1 ano, pois o primeiro filho, Clemente havia falecido 2 anos antes aos onze dias de vida; Carlos com 27 anos, sua esposa Maria Celeste Cadore com 25 anos e o filho Agostino com 6 meses; Próspero com 23 anos e sua esposa Thereza Cadore (?), cujo casamento foi na véspera da viagem dia 23\12\1875; Giudita com 20 anos e seu noivo Adamo Conci (?), cujo casamento se deu já em terras de Nova Trento dia 25\09\1876; Giovanni com 18 anos e Giovanna com 14 anos, ambos solteiros. Junto da família de Antonio, veio também muitos parentes das noras e dos genros.  O filho Luigi com 25 anos e Anna, filha mais velha, com 34 anos, seu esposo Giuseppe Battisti (?) e os filhos Luiz com 5 anos, Carlos com 3 anos e Maria com 1 ano, viriam mais tarde, pois ainda não haviam decidido emigrar e Luigi estava noivo e o casamento marcado para o mês de Fevereiro com Margherita Moratelli, cuja idade era de 25 anos. A cerimônia se realizou no dia 29\02\1876 na Comune de Borgo Valsugana. Os livros consultados relatam que a partida das localidades, costumeiramente, fazia-se em grupos. As comitivas que vinham dos vales, por diversos meios de transporte, carros de boi, carroças ou a pé, encontravam-se nas estações ferroviárias de Trento ou de Rovereto. A visão de camponeses carregados de bagagens, uns alegres, outros tristes, dirigindo-se à tão sonhada “Mérica”, era um espetáculo deveras comovente! A estação  ferroviária estava lotada de emigrantes, carregados de bagagens e lembranças. Alguns levavam garrafas de vinho, outros, sementes para plantar na nova terra, outros ainda portavam utensílios de cozinha e ferramentas.  VICENZI (1985 p.91-92) cita o relato da Professora Maria de Lourdes Rafaelli Scoz sobre a vinda de seu avô Giovanni Batista Rafaelli, seu tio Alessandro Rafaelli e também outros imigrantes de Rio dos Cedros, para que possamos ter um pouco mais de detalhes sobre aquela aventura de fazer a América e que retrata o que deveria ter sido a viagem de Antonio Voltolini e familiares, pois, como, a família Rafaelli, os membros da família Voltolini também saíram da região de Trento. “Partiram de Trento num trem, que atravessou os Alpes por um túnel “muito grande”, a caminho do porto de Marselha na França (...). Esse túnel que eles se referiam, é certamente o “Moncenisio” do monte Cenis da cordilheira dos Alpes, com 3.538 metros de altura, chamado também Frejus tem 13.038 metros de comprimento e comunica Bardonecchia italiana com Modane francesa a 1000 metros de altitude, inalgurado em 1871, sendo considerado um dos maiores túneis do mundo. (...) Outro episódio bastante impressionante que lhes ficou gravado para sempre em seus corações, foi a chegada à Marselha, quando viram o navio que os devia transportar para o Brasil através do Oceano Atlântico. O pânico aponderou-se de quase toda aquela gente. Momentos de dúvidas e de apreensão ameaçavam a coragem de prosseguir viagem. Tomada de comoção irresistível e contagiosa não pôde resistir as lágrimas. As mulheres atiravam-se nos braços dos seus maridos e abraçavam seus filhos desesperadamente entre prantos e lamentações. “cosa abbiamo fatto, cari da Dio... Ritorniamo in dietro, ritorniniamo in dietro...” Voltemos para traz, voltemos para nossa terra... Aquelas famílias viram pela primeira vez, o mar Mediterrâneo do qual tanto ouviram falar, mas que nunca teriam imaginado fosse tão extraordinário assim. A imensidão das águas atemorizava aqueles passageiros indecisos. Morremos todos, diziam, o mar será nossa sepultura. Mas os dardos estavam lançados. A sorte decidida. Era preciso partir. A nova Pátria os esperava. Sentiam abandonar a sua. O futuro já estava planejado, por isso encorajando-se mutuamente uns nos outros e cheios de esperança, subiram ao navio para o embarque na certeza que Deus estava com eles. “Andiamo, coraggio compagni” A hora da partida do navio do porto de Marselha, abanavam suas mãos para a terra querida da Europa, que nunca mais haveriam de tornar a vê-la”. Testemunhas participativas do comovente espetáculo e, na iminência de uma partida sem retorno, Antonio Voltolini, familiares e seus companheiros de viagem, sentem na pele, o medo do desconhecido. A narrativa dos Rafaelli vai de encontro com o que diz Grosselli (1987) “A vastidão do mar a separá-los da sua querida pátria, a busca aventureira do desconhecido repleto de incertezas e perigos com os quais poderiam defrontar-se na terra distante, eram aplacadas e amenizadas pela confiança que depositavam naqueles que os chamavam a construir as riquezas de um país novo e pouco conhecido.” As promessas eram confortadoras e a coragem não lhes faltava! Dio Santo!...Valeria a pena encará-las e vivenciá-las, não importando as dimensões e o tipo de dificuldades que surgissem. Venceriam! Acredita-se que esta teria sido a rota seguida pela Organização Caetano Pinto, uma vez que a Organização estava instalada em Marselha e  os portos mais seguros para embarque de emigrantes eram os franceses, por fazerem menos exigências e por facilitarem o embarque. Especialmente, em 1875 e 1876, as partidas para o Brasil se fizeram pelos portos de Marselha e Le Havre, pois nesses portos a Organização Caetano Pinto contava com o apoio das autoridades brasileiras em Marselha, entre elas o vice-cônsul Da Costa Saraiva. “(...) Na manha do dia seguinte, a chegada ao porto. Formavam-se grupos de pessoas com afinidade de origem, dialeto ou então parentesco. Uma sirene estridente quebra o torpor da manhã. Era a hora da apresentação dos documentos para o embarque. As pessoas se aglomeram, muitos eram tomados pelo pânico e relutavam em embarcar. Começa o embarque, eram muitos os emigrantes. Haviam muitas dificuldades com as autoridades francesas, pois, não falavam o italiano e precisam da ajuda dos agentes. Era grande o risco de epidemias, principalmente a varíola, que vitimava quase sempre, velhos e crianças. Havia também o antigo temor das tempestades em alto mar. Depois de algumas horas, estavam todos a bordo, tragados pelo gigante de aço. A maioria Trentinos, mas havia também, Vênetos e Lombardos. Os alojamentos não eram adequados e suficientes. A passagem de terceira classe não poderia prover-lhes melhor sorte. Enfim, todos se acomodavam nos beliches, alguns colocam os colchões no chão, amontoam malas e sacolas em qualquer local disponível. A noite deveriam permanecer  separados por sexo; homens de um lado, mulheres, crianças e bebes de outro. Aos poucos o navio vai deixando o cais do porto, no Canal da Mancha, em direção ao Atlântico Norte, agora só se avista, céu e mar. Passados alguns dias, o Capitão avisa que já estão próximo a Ilha da Madeira, já nas costas da Àfrica. A água existente é basicamente para beber. A comida consiste basicamente de uma sopa rala de batatas. Fazia-se acompanhar, um naco de queijo curado que haviam trazido na bagagem. Pela manhã um café muito fraco. Diminuiu o forte cheiro de vômito dos primeiros dias, com a adaptação ao balanço do navio. Os dias são longos; chegam noticias de óbitos, outras notícias de pessoas adoecidas, crianças e velhos que padecem. A religiosidade os fortalece, pois são famílias essencialmente católicas e, ao cair da tarde, participam de forma compenetrada e intensa, das orações e cânticos. VICENZI (1985 p.120) “Já em viagem, através do Oceano Atlântico, devido a enfermidades diversas, alguns morriam. Seus cadáveres eram jogados então ao mar, mas como se fora um verdadeiro sepultamento. “Fazia-se velório e acompanhava-se o morto com orações e cantos dirigidos por um leigo capaz de fazê-lo, até que as águas envolvessem o corpo”. “Os dias continuam muito compridos e as noites intermináveis. “Finalmente em um entardecer, vem o aviso da cabine de comando: No dia seguinte deveriam chegar ao Rio de Janeiro ...A travessia do Atlântico demorou, aproximadamente, 70 dias e, só Deus sabe, quantos imprevistos, obstáculos e sobressaltos viveram neste interstício. Confinados em exíguos espaços na terceira classe do navio, eram presas indefesas de muitas doenças. Ali residia um feroz inimigo e, por isso, quando lhes permitiam, passavam horas e horas no convés. Uns matavam o tempo contemplando a imensidão do oceano, imaginando o perigo que o mesmo representaria durante uma tempestade. Alguns se distraíam com um jogo qualquer. Outros, em silêncio consigo mesmo, elaboravam projetos para o futuro que os aguardava. Muitos deles, como que para espantar a tristeza e a angústia que a todos atormentava,cantavam e dançavam alegres ao som da gaita, do violino e da clarineta, trazidos na bagagem. Por fim, avista-se o Rio de Janeiro! Descem do navio para cumprir as formalidades de ingresso no país. Localizar a bagagem foi o primeiro teste de paciência e de coragem em terra, diante do tumulto que se formara durante a busca da mesma. Claricia Otto,  Doutora em História e professora no Centro de Ciências da Educação na UFSC, da sua pesquisa ( “Entre mortos e feridos, loucos e perdidos” Curitiba, 2003 p.35) retiramos: “A coragem necessária para a partida precisou ser redobrada diante das amarguras e desilusões sentidas na travessia do Atlântico. Confinados nos navios, tiveram de sobreviver sem condições de higiene, separados de pais, de filhos, de irmãos e de parentes. Juntamente com a separação física, havia a frustração, a nostalgia e o medo da morte a qualquer instante. O Cônsul de Porto Alegre, Campans Di Brichanteau Edoardo, relata o cenário que presenciou na chegada de uma das levas de imigrantes: “Assistimos o desembarque de um pobre homem, pai de 5 filhos pequenos, que descia do navio, empurrando à frente os filhos que choravam e levando nos braços, o cadáver da esposa que morrera há poucas horas. Deposto o cadáver, aos prantos, subiu novamente a escada para voltar logo depois, trazendo nos braços mais um filhinho, também morto. Os imigrantes que sobreviveram guardaram na memória, as feridas da tensão e do medo vividos ao longo da travessia e a dor de terem visto os corpos das vítimas de alguma febre epidêmica, serem lançados ao mar. Outras frustrações somam-se a essas, dentre as quais, as más condições encontradas nos barracões de recebimento.”  São alojados em hospedarias, onde permanecem alguns dias para definir o local em que se fixariam no sul do país. Essas providências, aparentemente desnecessárias, na verdade eram importantes, pois nem todos haviam ainda feito sua opção em definitivo. Alguns preferiam o Rio Grande do Sul, outros o Paraná e outros Santa Catarina. Havia, também, aqueles que mudavam sua escolha. Não foi o caso dos nossos ancestrais que, ao embarcarem na Itália, destinavam-se à Colônia “Itajahy Príncipe Dom Pedro”, em Santa Catarina. Concluídos os trâmites legais e ultimados os preparativos, os imigrantes eram encaminhados ao navio que os transportaria às províncias escolhidas no sul.  Antonio Voltolini e familiares, provavelmente chegaram ao porto do Desterro no navio Vauban. Pela data em que iniciaram a viagem, 26\12\1875 até ao porto de embarque, provavelmente passaram-se uns três a quatro dias, com a data de chegada ao porto de Desterro  09\03\1876 data em que jornais do Desterro noticiavam a chegada de um navio de imigrantes italianos, passaram-se setenta e três dias. “Dia 09\03\1876, quinta feira, às 15 horas, ancorava no porto do Desterro, o navio francês “Vauban” conduzindo 416 imigrantes italianos para aquela colônia; procediam de Marselha e foram localizados em terras de Nova Trento. Transportados para o “Inhaúma” da Marinha Brasileira, e conduzidos até o porto de Itajaí, daí seguiram para os lotes que lhe estavam reservados.”  (Enciclopédia dos Municípios Brasileiros Vol. XXXII Rio de Janeiro 1959). Nossos destemidos e corajosos ancestrais, provavelmente vieram direto ao Porto de Desterro (antigo nome da cidade de Florianópolis) não desembarcando no Porto do Rio de Janeiro, pois nada encontramos nas listas de chegada naquele porto. PIAZZA (1994 3ª Ed p.201) refere-se à duas chegadas de imigrantes italianos no ano de 1876,em Nova Trento, ano em que a família de Antonio Voltolini chegou... “A 09 de Março de 1876, ancorava no porto do Desterro o navio francês “Vauban”, procedente de Marselha, com 416 imigrantes trentinos que se destinavam à colônia “Itajai-Brusque”. “A 14 de Setembro do mesmo ano de 1876, pelo vapor “Werneck”, chegavam 700 italianos de diversas procedências”. Sendo que, Anna Petris, filha de Madalena Voltolini e de Micheli Petris nascera em 03\04\1876 e batizada dia 30\05\1876 em Nova Trento, podemos afirmar que aportaram em Santa Catarina pelo porto do Desterro em 09\03\1876 às 15:00 horas, numa quinta feira no navio “Vauban”, e  Foram transportados até o porto de Itajai pelo “Inhaúma” da Marinha Brasileira.   

Nenhum comentário:

Postar um comentário